Para um filho que enfrenta uma dor invisível e avassaladora, o lar deveria ser o porto seguro definitivo. No entanto, a rotina agitada, a dificuldade de comunicação e, por vezes, a falta de informação podem fazer com que pais não percebam os sinais sutis de que um filho está em perigo. Identificar os alertas e agir com amor, firmeza e rapidez não é apenas um ato de cuidado, mas uma intervenção que pode salvar uma vida.
Um filho que pensa em suicídio não quer, na verdade, acabar com a vida, mas sim com a dor insuportável que está sentindo. O papel dos pais é enxergar essa dor e mostrar a ele que existe outro caminho.
Parte 1: Percebendo os Sinais Dentro de Casa
Muitos sinais são semelhantes aos observados na escola, mas no ambiente familiar eles podem ser ainda mais evidentes ou, paradoxalmente, mais fáceis de serem ignorados e atribuídos a "coisas da idade". A atenção precisa ser redobrada.
1. Mudanças no Comportamento e na Rotina
- Isolamento no Quarto: Passar muito mais tempo trancado no quarto do que o habitual, evitando as refeições em família e qualquer tipo de interação.
- Alterações no Sono e no Apetite: Dormir muito mais do que o normal (fuga da realidade) ou sofrer de insônia. Comer em excesso ou perder completamente o apetite.
- Queda Brusca no Rendimento Escolar: Notas que despencam, reclamações da escola sobre falta de atenção ou de entrega de trabalhos. O filho pode se recusar a ir à escola.
- Abandono de Interesses: Perder a paixão por hobbies que antes amava, como jogar videogame, praticar um esporte, desenhar, tocar um instrumento ou sair com os amigos.
- Descuido com a Higiene e Aparência: Deixar de tomar banho, usar sempre as mesmas roupas ou não se importar com a aparência de forma geral.
2. Sinais Emocionais e Verbais
- Irritabilidade e Hostilidade Constantes: Explosões de raiva, respostas agressivas e impaciência com irmãos, pais e perguntas simples. Em jovens, a depressão muitas vezes se mascara de irritabilidade.
- Expressões de Desesperança e Inutilidade: Frases como "Eu sou um fardo para vocês", "Nada que eu faço dá certo", "Eu me odeio" ou "Seria melhor se eu não tivesse nascido". Nunca ignore essas frases, mesmo que ditas em um momento de raiva.
- Conversas ou Pesquisas sobre Morte: Interesse incomum sobre o tema, seja em filmes, músicas, ou no histórico de busca da internet.
- Atos de "Despedida": Doar objetos de grande valor sentimental, escrever cartas ou mensagens se despedindo, ou tentar "fazer as pazes" de forma inesperada.
- Calma Súbita: Se após um período de intensa agitação ou tristeza, seu filho se torna subitamente calmo e sereno, isso é um sinal de alerta máximo. Pode indicar que a decisão de morrer foi tomada, trazendo um falso sentimento de paz.
Parte 2: Como Ajudar — A Ação Correta dos Pais
Perceber os sinais é o primeiro passo. A forma como os pais reagem a seguir é decisiva.
1. Aja Imediatamente. Não Espere "Passar". Não caia na armadilha de pensar que é "drama", "para chamar a atenção" ou "uma fase da adolescência". Mesmo que seja um pedido de atenção, é um sinal de que algo está muito errado. Leve a sério, sempre.
2. Crie um Momento para Conversar (e Escutar).
- Escolha o lugar e a hora certa: Chame seu filho para conversar em um lugar neutro e privado, sem distrações (desligue a TV e os celulares).
- Comece com uma abordagem de preocupação, não de acusação: Em vez de "O que há de errado com você?", tente "Filho(a), eu tenho notado que você não parece bem. Estou preocupado(a) e quero entender o que você está sentindo. Eu estou aqui para você".
- Ouça mais do que fale: Deixe seu filho desabafar. Não interrompa, não julgue, não dê sermões. Apenas ouça. Valide seus sentimentos com frases como "Isso parece ser muito doloroso" ou "Eu sinto muito que você esteja passando por isso".
3. Pergunte Diretamente sobre Suicídio. É um mito que falar sobre o assunto vai "plantar a ideia". A verdade é que perguntar pode ser o maior alívio para seu filho, que finalmente se sentirá compreendido.
- "Com toda essa dor, você tem pensado em se machucar?"
- "Filho(a), você já pensou em tirar a sua própria vida?" Se a resposta for "sim", mantenha a calma (mesmo que seja apavorante) e agradeça a ele pela coragem de ter contado. Reafirme que vocês passarão por isso juntos.
4. Busque Ajuda Profissional URGENTEMENTE. Você não precisa e não deve lidar com isso sozinho.
- Psicólogo e Psiquiatra: A ideação suicida é uma emergência de saúde mental. Marque uma consulta com um psicólogo e um psiquiatra imediatamente. Se o risco for iminente, leve seu filho a um pronto-socorro psiquiátrico ou hospitalar.
- Remova o acesso a meios letais: Remova do alcance do seu filho qualquer objeto ou substância que possa ser usada para se ferir (armas, remédios, venenos, objetos cortantes).
5. Fortaleça a Rede de Apoio.
- Comunique a escola: Informe o coordenador pedagógico ou o psicólogo da escola sobre a situação para que eles também possam oferecer suporte.
- Esteja presente: Mais do que nunca, seu filho precisa da sua presença física e emocional. Faça pequenas coisas juntos, mesmo que ele resista no início. Mostre, com atitudes, que ele não está sozinho.
O amor de pais, combinado com a ajuda profissional correta, é a força mais poderosa para resgatar um filho da escuridão. Não hesite, não tenha medo de perguntar e, acima de tudo, não desista do seu filho. A dor dele é real, mas com apoio, ela pode ser superada.